Luciano Nascimento - Repórter da Agência Brasil
Na reta final para o segundo turno em 57 municípios, o papel dos prefeitos ainda é motivo de dúvida entre eleitores. Representante máximo do Poder Executivo municipal, é o prefeito quem comanda a administração da cidade, sendo responsável pela gestão dos serviços públicos do município como educação, saúde, transporte e limpeza pública, entre outros.
Como boa parte dessas políticas é executada em parceria com os governos estadual e federal, é comum haver dúvida sobre a extensão das responsabilidades municipais, especialmente em áreas como saúde, educação, assistência social, saneamento. Também entram nessa lista temas como mobilidade urbana e segurança pública, que cada vez mais vêm tendo destaque nas campanhas eleitorais dos municípios.
Em geral, a ajuda dos governos estadual e federal se dá por meio de repasses de verbas, convênios e auxílios de toda natureza para a realização de obras e a implantação de programas sociais. Às prefeituras cabe essencialmente cuidar de programas de assistência social, da limpeza das ruas, coleta de lixo, do transporte público, assim como debater e definir, em conjunto com a Câmara de Vereadores, o zoneamento urbano da cidade. Eventualmente, a depender do interesse, os municípios podem assumir os serviços de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto.
Educação e saúde
No caso da educação, a responsabilidade dos municípios se dá na garantia da educação infantil e do ensino fundamental. Na saúde, compete aos municípios garantir os serviços de atenção básica. As prefeituras também criam políticas de saúde e colaboram com a adoção das políticas nacionais e estaduais, aplicando recursos próprios (mínimo de 15% de sua receita) e os repassados pela União e pelo estado.
Para o cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) Flávio Britto, em políticas nas áreas de saúde e educação, a população está mais consciente do papel desempenhado pelos municípios. “Acredito que nessas políticas a população já está mais ciente de quem deve cobrar, mas, em outros casos, pode haver confusão com relação ao papel do prefeito, a exemplo da questão da segurança pública”, disse à Agência Brasil.
Segurança
O professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e doutor em direito público e direitos humanos pela University College London (UCL) Michael Mohallem considera que temas como mobilidade urbana e segurança pública passaram a ter mais atenção por parte do eleitorado, que reivindica às autoridades soluções para os problemas, mesmo que a responsabilidade, no caso da segurança pública não seja das prefeituras.
Segundo Mohallem, essa confusão mostra a preocupação da população com temas que dizem respeito ao dia a dia e que acabam “respingando” na campanha. “Em alguns lugares, esse debate tem surgido entre os candidatos a prefeito e tem gerado alguma confusão, especialmente no que diz respeito à segurança pública. Isso acaba colocando em segundo plano o debate sobre algumas competências essenciais do município, como a coleta de lixo e a questão do transporte público”.
O professor lembra que a responsabilidade sobre a segurança pública é dos estados e que, no caso dos municípios, as guardas municipais têm muito mais o papel de proteger o patrimônio público do que tratar da segurança pública. “O governador do estado é quem comanda tanto a Polícia Civil quanto a Militar e são elas que têm o papel de investigação, de prender bandidos. No caso municipal, o que a gente tem são as guardas civis metropolitanas, com papel muito mais patrimonial do que repressivo” afirma.
De acordo com Mohallem, apesar de o tema ter entrado na agenda política das eleições municipais, a maioria das propostas ainda é superficial. “A maior parte das propostas gira em torno de se criar sinergias, como um bom diálogo com o governo estadual, uma forma de atuação conjunta da Polícia Militar com a Guarda Civil Metropolitana, de modo que a Guarda Civil possa fazer a proteção de alguns ambientes, de alguns espaços públicos e possa afastar a criminalidade”, disse.
Na opinião do professor da FGV, a atuação conjunta da prefeitura e do governo do estado pode possibilitar que mais áreas da cidade sejam cobertas por algum tipo de segurança. Para ele, tanto prefeitos quanto vereadores têm papel fundamental no debate sobre segurança pública. “Essa é uma das áreas em que a população mais espera resposta e, como é uma área que não está sob responsabilidade direta do prefeito, a situação é delicada no sentido de se tentar uma resposta que não seja simplesmente uma negativa.”
De acordo com Mohallem, prefeitos e vereadores podem entrar no debate de temas como a desmilitarização da Polícia Militar ou da redistribuição das competências constitucionais da União, de estados e municípios. “É competência do deputado federal e do senador alterar a Constituição e as leis federais, mas o prefeito pode atuar como um agente na discussão desses temas”, disse. “Infelizmente não se vê isso com muita frequência nas propostas. Em geral, fica mais no âmbito de promessas como 'vou colocar a Guarda Civil na rua', 'vou atuar com o governador'”, afirmou.
A professora de direito da FGV no Rio de Janeiro Silvana Batini disse à Agência Brasil que é comum encontrar esse tipo de confusão em época de eleições. Doutora em direito público e especialista em direito eleitoral, Silvana afirma que apesar da confusão de papéis, é importante que o debate apareça nas eleições. “Até para que o eleitorado saiba o alcance das propostas dos candidatos”, destaca.
Para Silvana, apesar de os municípios terem limitações constitucionais no que diz respeito à segurança pública, é falso dizer que eles não podem desempenhar um papel importante nessa área, especialmente com políticas de prevenção. “Não precisa nem falar somente de Guarda Municipal, que também faz parte desse complexo de medidas, mas de outros aspectos como iluminação pública, ocupação do espaço público, melhoria da mobilidade urbana, políticas de acesso à cultura e ao lazer. São medidas que podem contribuir para essa pauta ampla e complexa de segurança pública”.
Prevenção
De acordo com a professora, políticas de prevenção também ajudam a construir uma cidade mais segura. Ela cita como exemplos projetos voltados para a ocupação de espaços nas cidades, como praças e passeios públicos, ente outros. “Essa ocupação interessa à cidade. Não adianta você fazer uma política para reduzir a violência e criminalidade de uma determinada área se a prefeitura não vier com a sua máquina, com as suas competências para ocupar essa área e trazer melhorias à população. Isso também diz respeito à segurança pública. É importante o eleitor saber qual o papel do prefeito. Mas é importante também que esse debate [sobre a segurança] seja trazido para as eleições municipais”, acrescenta.
Edição: Juliana Andrade
Agência Brasil
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